O poeta Thiago de Melo escreveu um verso que sempre me intrigou: ” Se você não sabe para onde ir, qualquer caminho serve”. Fiz escolhas na vida, escolhendo caminhos. Um deles foi o de estudos. Árduo caminho para uma filha de colonos. Deixei o caminho da terra. Porém, o elemento terra nunca deixou meu caminho.

Retorno à natureza ou as minhas raízes?

Quando  menina vivia no  sitio e costumava visitar amigos com meus pais, geralmente compadres. A casa não dividia os terrenos como agora nos centros urbanos. Os vizinhos moravam longe, léguas…por vezes montava -se cavalos, único meio de transporte disponível.

Lembro-me muito bem de uma visita ao compadre Leopoldo Borges. Fui com meu pai, o qual trataria nessa ocasião de pedir emprestado potreiro para soltar algumas vacas e bois porque a pastagem de suas terras estava escassa…

Eu disse “emprestado”…nada de aluguel de pastagem…tratava-se de um pedido do compadre. Solidariedade típica da época. Um socorria o outro lavrador por conta de plantio , colheita ou escassez de pastagens, como foi o caso da minha narrativa aqui.

Chegando lá, a comadre Irani e suas filhas não estavam. Compadre Leopoldo, o contador de causos da minha infância , não sabia como me agradar..levou-me a sua pequena horta.

Para chegar à horta, passava-se por uma casinha, feita de madeira, inclusive o telhado, chamava-se coberta de tabuinhas, cuidadosamente serradas e encaixadas como se fossem telhas. Essa casinha denominava-se  cozinha de chão. 

A cozinha de chão era palco para  contação de histórias, roda de chimarrão, sapecada de pinhão e de batata doce assada, porque havia fogo de chão.

O fogo de chão se mantinha acesso dia e noite. Colocava-se um tronco grosso de árvore para manter a brasa acesa.

Ainda sobre a cozinha de chão, “rolava ali” namoros…romances calientes…romances proibidos ..

Retorno à visita ao seu Leopoldo. Chegando à horta, deparei-me com uma linda plantação de tomates…vermelhinhos. Colheu o mais bonito e me ofertou, sem antes se  desculpar que não tinha nenhum doce, bolacha para oferecer para a castelhana , apelido carinhoso que me chamava.

Nunca mais esqueci desse carinho. Hoje sei diferenciar o sabor de tomate livre ou não de agrotóxicos. Graças ao presente tão singelo do Seu Leopoldo. Na minha memória olfativa , está materializada o sabor do tomate, que além de ser orgânico é carregado de laço afetivo.

Passado meio século, retorno às raízes . Troquei o apartamento de um prédio que beijava o céu…com 17 andares , por uma casa e, reconciliei-me  com a natureza. Encontrei-me com o caminho da terra. Primeira planta, acredite! Um pé de tomate! Robusto, saudável, livre de química..folhas aromatizadas, do jeitinho da plantação de Seu Leopoldo.

Só há uma diferença: agora os causos saíram da cozinha de chão…estão por aqui nos ditos e não ditos.       Meus caminhos, hoje, se alternam entre o cultivo de flores, tomatinhos…e a escrita dos causos que povoam minha memória. Sempre soube por que caminhos passar…contudo sem saber com o que, com quem cruzar…isso Deus se encarrega.

 

Compartilhe
0Shares
Escrito por Marta de Fátima Borba
Seguir meu coração foi minha melhor escolha. Sou corajosa. Quero melhorar a cada dia, porque sei que não estou pronta. Preciso evoluir. O que faço ou aquilo que me acontece, tem o poder de mudar meu humor, mas como vou reagir a isso, eu decido de maneira consciente!