Há muitos escritos sobre a etimologia das palavras, seja qual for a Língua. Encanta-me palavras de minha língua materna. Óbvio. Os sujeitos se constituem na e pela linguagem. Tornam-se sujeitos históricos a partir da interação memória-linguagem-história. Chamou-me atenção o comentário de um amiga : _ ESCANINHO? – Que palavra é essa?A princípio, achei que estava brincando, mas ela repetiu a pergunta. Aí percebi que ESCANINHO é palavra que pertence ao descarte do vocabulário da minha amiga. E como há descarte, desapego de palavras. Felizmente, vamos reciclando memória, reinventando a história. Novos sujeitos históricos vão surgindo.
No mesmo dia, fui convidada por um sobrinho de cinco anos, para entrar no seu quarto. Um novo sujeito histórico na minha frente. Sabe o famoso branco , expressão usada para dizer que não lembramos das coisas e de suas respectivas denominações? Ali, naquele universo imenso de bonecos representativos do mundo dos games, a sensação que tive foi de que estava desmemoriada, não o adjetivo equivalente à loucura( hic) mas a ausência necessária do sujeito histórico que inexiste em mim,totalmente analógica, para poder interagir com o sujeito histórico de um menino de cinco anos, totalmente digital. Deu branco.
Entendi que o mundo digital deletou o analógico. Na tentativa de diálogo, tive a impressão que estava diante de uma nova língua. Precisei “desapegar” de palavras para poder minimamente entender o que meu interlocutor tentava me ensinar, inserir-me no mundo digital de símbolos polissêmicos. E, que com uma desenvoltura encantadora foi me apresentando a memória da linguagem digital.
Esse novo ser histórico dá conta de geografia, de história, de biologia, de sociologia, de filosofia, de ecologia…-“Olha, cuidado, não pegue esse ovo…(símbolo do comando do game) ele contamina o solo..e poderá acontecer mutação indesejada…” _”Olha, esse ninja é chinês!’ _ Esse, fala nossa língua! E assim, foi me apresentando esse universo reinventado pela tecnologia. Num belo e bom português. Com todos os “s” finais, sujeito e predicado em concordância nominal e verbal. E, o que mais me animou um novo sujeito histórico gentil, pronto para ensinar a criação de novas memórias.
Escaninho é o que mesmo? Foi descartado. Virou arquivo. Virou link. Virou nuvem.
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